Pra contrariar finalmente a sina de Valentina, a guitarra do Poeta está a quatro anos no conserto. Até um possível violão fora extraviado por um maluco qualquer, quando o mesmo estava a caminho do seu futuro dono.
Quando a quis, ela não quis. Teve que querer mais umas três vezes, pra se dar conta de ele era potencialmente um romance daqueles avassaladores. Na verdade, precisou ele ter uma crise sartreana e sumir por alguns instantes, fazendo nascer no estômago dela algo gelado e que borbulhava. Deu medo de ele ser mais um daqueles figuras, que vem, colocam o mel na boca e depois somem.
Quando finalmente, resolveu se alinhar numa roupa mais ou menos, e trajar sua calcinha mais velha e frouxa listrada, pra ir de encontro com a melhor trepada da sua vida, dali nunca mais teve vontade de sair.
Valentina encantou-se, e mal sabe ela onde começou aquela coisa toda. Talvez teria sido a iguaria por ele apresentada do bar sujo ao lado, ou então ter lido seus textos incríveis. Até mesmo o fato do Poeta ter uma cara de vagabundo nata, que se mistura com sua estante de livros e sua coleção de vinil. Tem até um com poesias recitadas do Drummond. Ah, talvez seja demais pra um coração tão pequeno.
Esse poeta vem cuidando dela, regando flor por flor nascida da necessidade da sua presença.
Uma xícara de café com açúcar recentemente adquirido, especialmente pra ela. Esse Poeta além de cultivar algumas manias peculiares, não consome açúcar. Talvez ele pense que isso vai amenizar seus problemas de saúde, contrabaleceando com aquele torresmo gigante e sua dose de Gin diária. Uma camiseta de um preto descorado no canto do colchão da sala, tamanho P. Um corpo que guarda definitivamente o cheiro mais familiar da sua coleção infinita de cheiros.
Aquele cara, O Poeta, tem uma coisa que junta com o cheiro e com um cigarro atrás do outro que fuma, que a faz se sentir muito bem, como se retornasse a algum lugar de origem. Mautner e Noriel Vilela. Duas cafeteiras, sendo uma italiana e uma francesa. Uma máquina de expresso que ainda não funciona. Lima na geladeira. Uma boca carnuda e mãos imensas. E um cérebro de dar tesão na maior das frígidas.
Agora é assim, por um lado, acabou o sossego. Foi fazer um prato pra jantar e achou a comida pouco temperada. Colocou pimenta forte. Ainda assim estava sem graça. Pegou banana, descascou,colocou no prato. Ainda assim, faltava algo. Levantou e foi pra debaixo do chuveiro. A áua também não saciou sua inquietação. Tentou masturbar-se. Não conseguiu porque tinha algo que incompletava seu desejo.
Notou que não era desejo de comer, nem de nada.
Era só a falta do seu Poeta, ali do lado, acarinhando seus minutos com sua voz tenra e sua barba bagunçada, seu cheirinho suave, seu olhar miúdo que é de ventinho das oito da manhã.
É...
Acho que Valentina precisa urgentemente de uma cartomante.